terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Correio Forense - A nova lei seca depende de regulamentação do Contran ou pode ser aplicada imediatamente? - Direito Penal

30-12-2012 16:00

A nova lei seca depende de regulamentação do Contran ou pode ser aplicada imediatamente?

 

 

As polêmicas em torno da nova lei seca já começaram: um delegado de polícia em Goiás (ver site do G1) deixou de autuar em flagrante um motorista embriagado alegando que a lei precisa ser regulamentada pelo Contran. De fato, a nova lei (§§ 1º e 3º do art. 306) diz que o Contran (a) vai especificar os sinais que indiquem a alteração da capacidade psicomotora e (b) que vai dispor sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia para o efeito da caracterização do crime tipificado neste artigo.

 

De acordo com nossa opinião a lei é autoaplicável (deve ser aplicada imediatamente, independentemente de novas regulamentações). Por quê?

 

Equivalência entre os testes de alcoolemia

 

No que diz respeito ao segundo ponto (equivalência entre os distintos testes: exame de sangue e etilômetro) penso que a própria lei resolveu o assunto: O inc. I, do § 1º, do art. 306, diz: “§ 1. As condutas previstas no caput serão constatadas por: I – com concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de al alveolar”. A própria lei fez a equiparação. O Contran não pode contrariar o texto legal.

 

Sinais que indiquem a capacidade psicomotora do condutor

 

Quanto ao primeiro ponto Francisco Sannini Neto e Eduardo Luiz Santos Cabette, delegados de polícia, explicam (no portal Atualidadesdodireito.com.br) o seguinte:

 

“No inciso II do mesmo dispositivo surge o primeiro deslize do legislador. Considerando que o tipo determina que as condutas do caput serão constatadas por “sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo CONTRAN, alteração na capacidade psicomotora”, muitos poderão entender que estamos diante de uma norma penal em branco, o que, em última análise, impediria a aplicação da nova Lei.”

 

“Com a devida vênia, o complemento a que faz menção o dispositivo constitui apenas um plus ou um adendo aos outros meios de constatação da embriaguez previstos no próprio tipo do artigo 306.”

 

“Isto, pois, no §2°, o legislador deixa claro que a verificação da redução da capacidade psicomotora do motorista poderá ser obtida mediante diversos meios de provas, tais como depoimento testemunhal, exame clínico e até por vídeos. Por tudo isso, não concordarmos que se trata de uma norma penal em branco. Além disso, para aqueles que não se satisfaçam com essa explicação, é fato que está em vigor atualmente a Resolução CONTRAN n. 206, de 20 de outubro de 2006, a qual nada mais faz do que repetir as normativas já delineadas no atual § 2º, do artigo 306, CTB de acordo com a nova redação dada pela Lei 12.760/12. A verdade é que o recurso à Resolução do CONTRAN é despiciendo mesmo. Isso porque quando se fala em prova penal, se está tratando de matéria Processual Penal, cuja origem somente pode ser, por força constitucional, lei ordinária federal. O CONTRAN não tem atribuição para regular matéria de prova penal, não pode “legislar” sobre matéria processual penal. Portanto, é de se concluir que o inciso II do artigo 306, CTB é autoaplicável de acordo com as normas processuais penais referentes às provas, sendo, como já afirmado acima, eventual Resolução do CONTRAN, mero adorno que somente pode ter alguma maior utilidade no ramo administrativo. Seria mesmo surreal imaginar o CONTRAN regulamentando prova pericial, prova testemunhal, prova documental etc. na seara processual penal.”

 

“Em nosso entendimento, a regulamentação a ser feita pelo CONTRAN teria como destinatários apenas os agentes de trânsito, que se utilizariam deste ato normativo para decidir sobre a necessidade ou não de encaminhamento do condutor do veículo até a Delegacia de Polícia.”

 

“Nesse ponto, destacamos que, sem embargo do disposto no §2°, do artigo 306, de acordo com o Código de Processo Penal, sempre que a infração deixar vestígios, é indispensável a realização de perícia. Desse modo, mesmo diante de uma prova testemunhal ou de um teste de alcoolemia, é necessário o encaminhamento do suspeito ao Instituto Médico Legal para a realização do exame clínico ou de sangue. Essa obrigatoriedade da prova pericial nos chamados “crimes de fato permanente” (“delicta facti permanentis”), somente pode ser superada muito excepcionalmente nos termos do artigo 167, CPP, acaso a falta da perícia não se dê por desídia dos agentes estatais, mas por obra do próprio infrator.”

 

“Diante desse novo quadro, parece-nos que o exame clínico constituirá o principal meio de prova da embriaguez, haja vista que o médico legista é o agente mais indicado para avaliar o estado do investigado. Assim, testemunhas, vídeos e outros meios de prova seriam utilizados apenas de maneira subsidiária, quando não for possível a realização de perícia, de acordo com o já citado artigo 167, CPP ou mesmo como coadjuvantes dos exames periciais mais adequados.”

 

“Com o objetivo de ilustrar essa situação, imaginemos o caso em que o suspeito se recuse a colaborar com o exame clínico ou não possa fazê-lo em virtude dos ferimentos causados por um acidente. Em situações como esta, a prova pericial poderá ser substituída por depoimento de testemunhas ou por vídeos. Também nada impede que sendo realizadas as perícias, também se colham provas testemunhais, vídeos, fotos , objetos apreendidos etc. a fim de reforçar o arcabouço probatório.”

 

Resolução 206/2006 do Contran

 

A Resolução 206/2006 do Contran, de fato, determina que o agente público, no momento em que se depara com um condutor suspeito, faça o seguinte:

 

Relato:

 

a. O condutor:

i. Envolveu-se em acidente de trânsito;

ii. Declara ter ingerido bebida alcoólica;

Em caso positivo, quando:

iii. Declara ter feito uso de substância tóxica, entorpecente ou de

efeito análogo.

Em caso positivo, quando:

iv. Nega ter ingerido bebida alcoólica;

v. Nega ter feito uso de substância tóxica, entorpecente ou de

Efeito análogo;

 

b. Quanto à aparência, se o condutor apresenta:

i. Sonolência;

ii. Olhos vermelhos;

iii. Vômito;

iv. Soluços;

v. Desordem nas vestes;

vi. Odor de álcool no hálito.

 

c. Quanto à atitude, se o condutor apresenta:

i. Agressividade;

ii. Arrogância;

iii. Exaltação;

iv. Ironia;

v. Falante;

vi. Dispersão.

 

d. Quanto à orientação, se o condutor:

i. sabe onde está;

ii. sabe a data e a hora.

 

e. Quanto à memória, se o condutor:

i. sabe seu endereço;

ii. lembra dos atos cometidos;

 

f. Quanto à capacidade motora e verbal, se o condutor apresenta:

i. Dificuldade no equilíbrio;

ii. Fala alterada;

 

Afirmação expressa de que:

De acordo com as características acima descritas, constatei que o condutor [nome do

condutor] do veículo de placa [placa do veículo], [está/não está] sob a influência de

álcool, substância tóxica, entorpecente ou de efeitos análogos e se recusou a submeterse

aos testes, exames ou perícia que permitiriam certificar o seu estado.

 

Conclusão: Come se vê, o tema já está todo regulamentado. Logo, de acordo com nossa opinião, não cabe à autoridade policial negar aplicação à lei nova, sob a alegação de falta de regulamentação pelo Contran.

Autor: Luis Flávio Gomes


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