22-03-2010 12:00Reforma do processo penal divide juristas
A reforma do Código de Processo Penal (CPP), aprovada na quarta-feira na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, ainda divide juristas. Se os advogados comemoram o aumento das garantias individuais aos clientes investigados e processados, promotores e policiais criticam excessos que, para eles, podem inviabilizar as apurações, atrasar a Justiça e aumentar a impunidade.
O ponto mais polêmico é a criação dos juízes de garantias. Pelas leis em vigor, o sistema judiciário funciona assim: a primeira fase é o inquérito, período em que a polícia vai levantando provas e solicitando autorização para fazer diligência, e as envia ao juiz e ao Ministério Público. A regra nesse período é o absoluto sigilo e, por essa lógica, nessa fase não é obrigatório ouvir-se os acusados. A segunda fase começa quando o MP faz a denúncia ao juiz. É o processo judicial. A partir desse momento, a regra passa a ser a publicidade dos atos e, então, a ampla defesa dos acusados passa a ser não só um direito como uma obrigação.
Com a criação dos juízes de garantia, prevista na proposta do novo Código Penal, o magistrado que atuar na fase de inquérito não poderá atuar na fase de processo. Para os advogados, isso impede que o julgador de um crime se contamine com a investigação e não tenha isenção para dar uma sentença. Essa queixa foi particularmente sentida na Operação Satiagraha, quando os advogados do banqueiro Daniel Dantas argumentaram à exaustão que o juiz Fausto de Sanctis não tinha isenção para atuar no processo que acusa o dono do Opportunity de crimes financeiros.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) queria mais. Achamos extraordinária essa iniciativa e propomos até o promotor de garantia, revela Délio Lins e Silva, um dos relatores da comissão da OAB encarregada de acompanhar a tramitação do projeto. Ele reconhece que, por natureza, o juiz tem que fazer cumprir a lei que dá garantias aos investigados mas entende ser necessário enfrentar uma situação de estado autoritário.
Do jeito que está acontecendo hoje, esse estado autoritário em que nós vivemos, tudo acontece na fase pré-processual: quebra de sigilo, escuta telefônica, o delegado fala uma coisa exagerada, o Ministério Público embarca naquela coisa, e a imprensa divulga tudo, reclama Lins e Silva.
Mais moroso
A visão de membros do Ministério Público e dos policiais é oposta. Para eles, a exigência de dois juízes diferentes tornará o processo mais lento e aumentará a possibilidade de recursos e embargos. A fase do inquérito, acreditam, vai virar uma outra fase processual, em que os advogados usarão todas as medidas possíveis para colocar recursos e enterrar a investigação. O presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), Antônio Carlos Bigonha, diz que o processo penal vai ficar mais lento, o que aumenta a impunidade dos criminosos, inclusive do colarinho branco.
É desolador, o código deveria ser para tornar o processo mais rápido, protesta. Quem não tem razão, quer a morosidade do processo. Eu acredito na Justiça. Não precisa ter dois juízes.
Bigonha concorda com o presidente da Comissão de Prerrogativas da Associação dos Delegados de Polícia Federal (ADPF), Marcos Leôncio Ribeiro. O delegado diz que é até difícil implantar o modelo de juiz de garantias. Cada vara teria que ter dois magistrados. Ribeiro é outro que acredita que o modelo vai trazer mais morosidade e, consequentemente, mais impunidade.
O vice-presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Nino Toldo, vê a figura do magistrado de garantias com simpatia. Em tese, eu concordo. A contaminação pode existir. O juiz é um ser humano, afirma ele. Entretanto, Toldo tem dúvidas como isso vai acontecer na prática.
Produção de provas
Os magistrados e policiais ainda estão raivosos contra a possibilidade de o juiz poder solicitar a produção de provas para orientá-los em suas decisões. Pela lei atual, os juízes podem requerer as medidas em qualquer fase (inquérito ou processo). Com a mudança, é possível que os julgadores tenham que dar sentenças mesmo que estejam em dúvidas. E, em caso de dúvida, as medidas têm que ser a favor do réu.
Toldo lembra que, em certa ocasião, nem o Ministério Público nem a defesa solicitaram a busca de uma carta com instruções sobre como uma testemunha deveria se comportar num depoimento à Justiça. Informado disso, ele solicitou a busca e apreensão do documento, que baseou uma condenação num caso de tráfico internacional de drogas. No novo CPP, eu não poderia fazer isso.
Para Ribeiro, o projeto no Senado parte do princípio de que as autoridades sempre estão abusando de seu poder de investigar e acusar. Esse clima fez com que uma série de limitações típicas do processo fossem trazidas para a investigação. Os policiais acham que vai ser mais difícil produzir um inquérito inconteste.
Disputa na Câmara
O projeto de um novo CPP foi aprovado na CCJ e segue para o plenário. Lá, deve ser aprovado, avaliam as entidades jurídicas. Depois volta para a CCJ e, novamente, para o plenário para ser feita a redação final. Em seguida, a matéria vai à Câmara.
E é entre os deputados que as entidades pretendem mexer mais no texto, a fim de garantir os interesses de classe e o que julgam ser melhor para a sociedade. Na Câmara, vamos rever tudo isso e alcançar outros objetivos, conta Lins e Silva. A OAB fez 33 propostas ao projeto, mas até agora só teve quatro delas acatadas integralmente.
O presidente da comissão de prerrogativas da ADPF tem certeza que o projeto vai passar do jeito que está no Senado. Na Câmara, eu não sei, diz Ribeiro.
Fonte: Congresso em Foco
A Justiça do Direito Online
Correio Forense - Reforma do processo penal divide juristas - Processo Penal
O Direito Penal e a segurança pública em notícias. Busca-se pela garantia do princípio da “nulla poena sine lege”, não há pena sem lei [Digesta 5.1.131], ou seja, “nullum crimen, nulla poena sine praevia lege”! Por fim, o blog tem por foco o Direito Penal Garantista, ou garantismo penal, onde não pode haver punição sem julgamento [Nulla poena sine iudicio] e sem processo (Secundum eventum litis, Segundo o resultado do processo), sem o Devido processo legal seja formal ou substancial.
quarta-feira, 19 de maio de 2010
Correio Forense - Reforma do processo penal divide juristas - Processo Penal
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